Há uma questão que podemos suscitar e prende-se com o Segredo de Justiça, será que ainda subsiste? Faz sentido hoje falar nele ou terá cedido face às violações constantes de que é vítima? Cumpre afirmar que o Segredo de Justiça existe, embora seja constantemente violado por tudo e todos, sem que haja condenações. Não devemos esquecer que a violação constitui crime pelo disposto no artigo 371º do Código Penal. O Segredo de Justiça apesar de existir é uma miragem, um instituto com interesse teórico que na prática não se respeita logo compromete a sua existência material.
Actualmente a regra é a da publicidade do processo penal desde o início até ao fim, só excepcionalmente é que isto não acontece. O código de processo penal de 1987 previa o segredo de justiça, na fase de inquérito, isto justifica-se em nome dos interesses da investigação, para esta fase processual ter êxito e em nome dos interesses dos arguídos ou de terceiros constituídos arguídos. Talvez fizesse mais sentido a fase de inquérito estar sujeita ao segredo justiça para que tenha mais sucesso como outrora, mas hoje em dia é muito difícil guardar um segredo e ainda mais difícil é conservar um segredo de justiça dado os meios tecnológicos e o acesso à informação. Qual a razão que rege o secretismo dos inquéritos se hoje no século XXI se sabe sempre tudo e a informação é difundida à velocidade da luz? A própria constituição de jornalistas como assistentes é um convite à violação do segredo de justiça. Dado o “status quo” vigente é difícil não violar o segredo de justiça se é que ele ainda existe…
Em vez de prender para investigar porque não investigar primeiro e depois prender? Não seria muito melhor? De acordo com a lógica e atendendo aos direitos fundamentais dos arguidos parece-me bastante mais sensato.
Há violações do Segredo de Justiça, que preenchem um tipo legal de crime, mas em Portugal ninguém é condenado por violação do Segredo de Justiça, há uma ausência de condenações nesta matéria, daí que há quem considere que o artigo 371º do Código Penal está obsoleto o que convida à reflexão se ainda faz sentido que seja considerado crime ou se o legislador susbstantivo deve adoptar por uma política criminal de despenalização ou até de descriminalização do Segredo de Justiça o que me parece uma solução razoável face as exigências, os tempos em que vivemos e o modo como está configurado o processo penal.
O Segredo de Justiça sendo uma miragem é vislumbrado no horizonte normativo ainda que na prática não se materialize. Embora processo penal seja secreto o princípio do contraditório vale sempre, pois o nosso processo penal é “Amigo” dos Direitos Fundamentais das pessoas em geral e dos arguidos em especial pois só deste modo garantimos um autêntico Estado de Direito e um processo penal de estrutura acusatória como é o nosso.
O autor não segue o novo “acordo” ortográfico.
António Manuel Afonso Mota
Advogado Estagiário