Conheça o testemunho de Pedro Mouta, enfermeiro no Hospital de São João.
Pedro Mouta tem 24 anos, vive em Folgosa, e é enfermeiro no Hospital de São João do Porto. Está, desde agosto de 2020, a trabalhar na ala de cuidados intensivos de doenças infeciosas e, por isso, trata doentes Covid-19 todos os dias.
Tomou a primeira dose da vacina da Covid-19 no dia 29 de dezembro e, a poucos dias da segunda toma, falou ao NOTÍCIAS MAIA sobre a confiança dos profissionais de saúde na vacina e sobre como tem sido lidar de perto com este vírus desde o início da pandemia.
Notícias Maia (NM): Para um enfermeiro que está desde o início da pandemia a cuidar de doentes Covid, o que é que significa o surgimento de uma vacina?
Pedro Mouta (PM): É uma esperança. Sei que pode parecer uma resposta cliché mas esta vacina é um sinal de que estamos a compreender melhor a doença em si e que há desenvolvimentos para parar esta pandemia. A esperança de que estamos a caminhar no sentido de regressar a uma vida semelhante à que tínhamos. Com algumas mudanças como é óbvio, mas o caminho é esse.
NM: É como uma luz ao fim do túnel?
PM: Sim, sem dúvida.
NM: Quando surgiu a informação de que o plano de vacinação começava pelos profissionais de saúde, já tinhas ideia de querias ser logo vacinado?
PM: Inicialmente senti algum receio. Como é uma coisa nova nunca temos logo a certeza absoluta e pensamos sempre nos efeitos que a vacina possa ter. Mas, de uma forma geral, não falando só por mim, quisemos ser vacinados. No fundo é aproveitar ao máximo a ciência que existe e em que nós confiamos.
NM: Entretanto já tomaste a 1ª dose da vacina. Correu tudo bem?
PM: Correu tudo bem. Tive apenas algumas dores no braço, mas isso já é o esperado. 80% dos efeitos laterais são esses, por isso nada de mais, não houve nenhuma complicação.
NM: Nem todos os profissionais de saúde querem receber a vacina. Porque é que achas que há colegas teus a não querer ser vacinados?
PM: Daquilo que sei, penso que tem que ver mais com a parte pessoal. Por exemplo mães que estão a amamentar, que têm os filhos pequenos, pessoas com algum tipo de doenças autoimune e que têm receio nesse sentido e que estão a ser aconselhadas pelos médicos. Acho que é mais nesse âmbito e não que propriamente ceticismo em termos da vacina.
NM: Como é que o hospital está a reagir ao surgimento desta vacina?
PM: Muito bem. Lembro-me que, no primeiro dia da vacinação e nos dias consequentes, houve mesmo muita afluência. O processo foi muito bem organizado pelo hospital, toda a gente estava animada e estava um ambiente ótimo lá no espaço onde fomos vacinados. Toda a gente estava empolgada.
NM: E em relação à população em geral, toda a gente deve ser vacinada?
PM: Sim. Claro que não se pode exigir nada a ninguém, mas das pessoas com quem vou falando, mesmo sem ser da área da saúde, noto que há muita vontade em tomar a vacina.
NM: Parece-te que o calendário de vacinação vai ser cumprido?
PM: Eu penso que sim, todos estão a trabalhar nesse sentido para que a calendarização da vacinação seja cumprida. Pode haver alguns atrasos sim mas acho que no geral tudo vai acontecer conforme está planeado.
NM: Sentes-te mais confiante para fazer o teu trabalho depois desta vacina?
PM: É assim, os cuidados mantem-se e não podemos descurar essa parte de todo, mas dá-nos uma certa confiança. É outro nível de proteção que não tínhamos até agora. Portanto, não descurando as medidas até então, agora temos ainda mais uma proteção, o que vai facilitar mais o nosso trabalho.
NM: O mundo foi apanhado de surpresa por este vírus. Estando tu formado desde 2018, sentes que estavas preparado para uma situação com estas?
PM: Acho que ninguém estava preparado. Antes desta pandemia, o mais próximo que tínhamos passado, a uma escala mínima, foi a Gripe A. Tenho colegas que estiveram lá ao serviço durante essa época e dizem não haver comparação possível. Por isso acho que nada nos consegue preparar para este ambiente. Claro que a experiência ajuda em aspetos como a quantidade de trabalho e a exigência, mas foi igualmente difícil para todos.
NM: No início ninguém tinha noção da escala que este vírus ia atingir. Como é que encaraste tudo isto no início? Tiveste medo?
PM: Acho que medo nunca cheguei a sentir, porque tinha confiança naquilo que estávamos a fazer e na proteção que nos era dada. Acho que eu e os meus colegas sempre encarámos isto como uma novidade e com bastante adrenalina. Não sei se me faço entender, mas foi de certa forma interessante de se experienciar. Este ano deu-nos traquejo, uma outra mentalidade e, fundamentalmente, ajudou-nos a crescer.
NM: Os profissionais de saúde foram muitas vezes apelidados de heróis. Vocês sentem-se esses heróis?
PM: É a nossa profissão. Nós só estamos a fazer aquilo a que estamos habilitados, é a nossa função. Vamos dar 100% de nós, como damos nos outros dias.
NM: Mas foi um ano duro…
PM: Sim, foi um ano muito duro. Com muito trabalho e com muitas novidades. A nossa sorte é termos uma equipa excelente. A situação foi e continua a ser muito exigente mas é bom quando temos pessoas ao nosso lado que estão a passar pelo mesmo. Há um apoio mútuo.