Patrícia Lopes tem 23 anos e terminou o curso de enfermagem em julho de 2020. Conheça o testemunho desta jovem maiata que começou a carreira numa altura de enorme exigência para a profissão.
A pandemia de Covid-19 veio relembrar-nos a importância dos profissionais de saúde. Ser enfermeiro atualmente tornou-se uma profissão ainda mais exigente. Mas como terá sido começar a profissão neste cenário de pandemia?
Para responder a esta pergunta, o NOTÍCIAS MAIA falou com uma maiata que terminou o curso no verão de 2020 e iniciou a carreira a meio desta crise sanitária.
Patrícia Lopes tem 23 anos e, desde setembro, já passou pela Saúde 24, pelos centros de testagem Covid-19 e, agora, integra a equipa do Hospital Privado Fernando Pessoa.
Conta-nos que o início foi muito difícil, que sente falta do toque com os pacientes mas que, no fim do dia, gosta muito da sua profissão.
Maia, Vencer a Pandemia, com estórias de maiatos contadas na primeira pessoa.
Notícias Maia (NM): Terminas o curso no verão de 2020. Como é que foi começar a trabalhar como enfermeira no meio de uma pandemia?
Patrícia Lopes (PL): Eu estava em estágio da faculdade quando começou a pandemia. Os meus professores estavam em pânico e decidiram que íamos todos para casa mesmo antes de Portugal inteiro parar. Ou seja, nós fomos as primeiras pessoas a vir para casa com medo de ficarmos infetadas com uma doença que o nosso seguro escolar não abrangia. Entretanto acabei o meu curso e decidi que iria parar um tempo.
Em setembro retomei e o meu primeiro emprego foi na Saúde 24. No início é bom porque começas a ganhar o teu dinheiro e já achas que és enfermeira. Mas faltava-me a parte de estar com alguém, de ter o toque, de estar a cuidar das pessoas, isto porque eu só atendia telefones e fazia a parte da triagem.
NM: E quando é que chegas ao hospital onde estás atualmente?
PL: Eu saí da Saúde 24 e fui fazer testes Covid-19 para aqueles Drives. Estive lá cerca de um mês e acho que foi aí que tive noção da quantidade de pessoas que estava em contacto com o Covid, nós tínhamos aos 500 testes por dia. Era tanta gente. Foi aí que eu tive mesmo a noção da realidade.
Entretanto começo a trabalhar no hospital em novembro. Na altura da entrevista não me disseram que era para integrar um serviço de Covid-19 mas, quando comecei, a necessidade do hospital era para internamento de Covid-19 e assim foi. Foi complicado porque eu vivo com os meus pais e com os meus avós e não os queria colocar em perigo.
NM: Esse medo de infetar os teus avós pela tua profissão fez-te entender a real noção da doença e do perigo de ser enfermeira nesta altura?
PL: Sim, eu acho que tive essa noção no primeiro dia que eu entrei lá. Fui logo colocada a trabalhar e acho que, enquanto me explicavam as minhas funções, a minha cara era de pânico absoluto. Para mim tudo aquilo era estranho. Não haver contacto, só ver os olhos das pessoas, ter o serviço separado com umas linhas no chão a dizer “parte suja” e “parte limpa”.
É preciso teres muito cuidado naquilo que fazes, naquilo que tocas e a maneira como tiras os equipamentos porque qualquer descuido pode infetar-te e depois vais para casa e infetas toda a gente.
NM: A preocupação ainda é a mesma ou já estás mais tranquila?
PL: Eu agora sinto que já sei lidar mais ao menos com isto. No início era tudo muito difícil porque eu tinha que pensar em tudo o que fazia. Agora já é tudo muito mais natural.
Mas a verdade é que é muito difícil na mesma e eu continuo a não me aproximar muito dos meus avós, por exemplo. Parece que as pessoas estão a perder o medo disto, mas não pode ser. As coisas ainda estão más e as pessoas estão mal. Não é uma brincadeira, o vírus é realmente muito mau e causa uma morte dolorosa, as pessoas sofrem!
NM: Estando num serviço Covid e sendo enfermeira, já foste vacinada contra a Covid?
PL: Já, já recebi as duas doses.
NM: Depois de as receberes sentes que ficaste mais segura para fazer o teu trabalho?
PL: Sim, isso sem dúvida. Dá assim um certo descanso e acho que isso foi a nível geral do nosso serviço. Acho que todos nós andávamos com muito medo. Acho que pela vacinação ter começado nos profissionais de saúde, temos de ser o exemplo. Não é por estarmos vacinados que deixamos de ter cuidados.
NM: Teres começado a exercer enfermagem nesta altura fez-te evoluir de uma forma mais rápida na tua profissão?
PL: Eu acho que foi mais rápido porque nós não tivemos tanto tempo de integração, ou seja, nós chegámos e já eramos precisos. Tivemos de chegar e fazer, e aí perdemos muitos medos.
Eu tive dois anos de estágio em que era tudo muito bonito, podia tocar nas pessoas e falar com elas. E agora não. Tu entras no serviço, fazes o que tens a fazer e vens embora. E eu acho que não estava preparada para isso.
NM: Para terminar, gostas de ser enfermeira?
PL: Gosto. Sinto que a pandemia veio valorizar muito a nossa profissão mas a verdade é que depois de isto acabar nós vamos voltar a ser desvalorizados. Gostava que isso fosse diferente. Eu gosto muito daquilo que faço, sempre foi aquilo que eu quis fazer e agora que trabalho nisto não me arrependo da minha escolha. Neste momento falta-me muito a parte do contacto pessoal, de estar com as pessoas, de falar com elas, de perceber até a suas vidas. Espero que aos pouquinhos possamos minimizar essa falta de contacto físico com as pessoas. Mas sim, gosto muito daquilo que faço e acho que é uma profissão muito bonita.