Mário Figueiredo é o diretor do Centro Comunitário do Sobreiro e conta-nos como é que esta estrutura tem lidado com a pandemia de Covid-19.
Fomos falar com o diretor do Centro Comunitário, Mário Figueiredo, para percebermos como é que se continua a apoiar a população mais vulnerável em tempos de pandemia e confinamento. O responsável garantiu que o Centro continua a prestar todo o apoio social e ainda revelou entusiasmo com a nova Praça do Oxigénio, que vai trazer novas instalações.
NOTÍCIAS MAIA: O que é que faz o Centro Comunitário Vermoim/Sobreiro?
MÁRIO FIGUEIREDO: O Centro Comunitário tem uma panóplia de intervenções na comunidade e basicamente destina-se a responder às necessidades da comunidade, não só do Sobreiro, mas também da comunidade alargada, que vai desde o apoio à família até à formação profissional, ao emprego, ao apoio psicológico, ao apoio de emergência social. É uma panóplia de serviços e multidisciplinar. Basta dizer que atendemos nos na totalidade cerca de 1200 utentes.
NM: Como foi afetada essa população e o Centro Comunitário pela pandemia?
MF: Foi muito afetada porque todos os serviços presenciais que temos, que são muitos, ficaram bloqueados devido à população com que trabalhamos, todo ela muito vulnerável, quer sobre o ponto de vista de saúde, da idade, condições estruturais ou de vida. Hoje temos um plano de contingência muito apertado para evitar contágio, portanto todos os serviços presenciais que temos ficaram suspensos. Felizmente conseguimos transformar alguns deles em online ou a distância. Há uns dois meses também temos conseguido ir visitar os idosos em casa que se encontram em solidão absoluta. São visitados duas vezes por semana por uma equipa de pessoas que se dedicam exclusivamente a isso. Estes utentes têm um apoio essencial que faz com que não se sintam sozinhas. Assim, duas vezes por semana, têm alguém com quem partilhar coisas. Também vamos lá trabalhar com elas na área da motricidade, da estimulação cognitiva, das artes plásticas. Planeamos sessões adequadas a cada pessoa. Mas isto no nosso universo é uma quantidade pequena de pessoas. Cerca de 15 em 1200. O resto estamos a publicar na nossa página de Facebook. Desde formação cognitiva, canto coral, expressão motriz, atividade física, contos, para que as pessoas possam trabalhar em casa. O maestro que é nosso colaborador publica e pressupõe-se que as pessoas ensaiem em casa.
NM: Vocês dão apoio ao nível de bens, mas também ao nível de convívio e de estimulação intelectual, mas há uma franja muito alargada dessa população que está a passar um mau bocado…
MF: Está a passar um mau bocado mesmo. Aliás, estamos a visitar estas 15 pessoas porque começamos a detetar nas nossas visitas, quando levávamos alguns mimos que nos dão e nós fornecemos, que havia um elevado défice de vontade de viver. A solidão é terrível. A solidão cria nas pessoas falta de objetivos de vida. A partir de dada altura começam só a viver de recordações e essa chama chega a um ponto que não é suficiente para as pessoas se sentirem vivas. E há muitas pessoas assim, nós é que não temos, estruturalmente, capacidade para apoiar mais gente porque há quem até tem um nível de vida mais elevado, mas que está sozinho na mesma. Não podem estar com os filhos, nem com os netos e isso está a impactar a sua saúde mental de uma forma… olhe, é a primeira que me debato com uma situação destas e já trabalho aqui há 34 anos. E isto não tem a ver com níveis socioeconómicos, é transversal.
NM: Houve muitos casos de Covid na população que atendem?
MF: Não. Aqui não tivemos ninguém. Tivemos três ou quatro casos, em 2020, logo no início, em pessoas que eram praticantes de Boccia e no grupo coral, mas nem foi transmitido aqui. Felizmente não houve grandes casos. Aqui no bairro também houve alguns casos, que eu até fui apoiar enquanto técnico social do território, mas comparando os moradores do bairro, que são 1500, foi mesmo uma percentagem muito reduzida.
NM: E que apoios é que o Centro Comunitário recebeu?
MF: Temos dois tipos de apoios para além da Santo Casa da Misericórdia, como é evidente, porque é a nossa entidade de suporte jurídico. Temos um apoio fundamental, que é o do Mercadona, que diariamente, à semana, nos fornece legumes, frutas, iogurtes, etc, já desde o ano passado. Isso permite a distribuir às pessoas alimentos de uma forma mais reforçada. A maior das pessoas com quem trabalhamos são muito vulneráveis do ponto de vista financeiro. E depois temos um apoio logístico importante por parte do município, que tem atendido às nossas necessidades e argumentos para melhor trabalhar com os utentes. Por exemplo, neste momento estão a distribuir refeições nas residências de utentes que se encontram no plano de emergência alimentar. Pessoas essas que se deslocariam aqui diariamente e neste momento só se deslocam ao fim de semana. O município não tem capacidade logística para distribuir ao fim de semana, mas pelo menos cinco dias por semana as pessoas ficam por casa, ou pelo menos na área de residência. Tem gente que vem de Águas Santas, de Nogueira, de Silva Escura, da Maia, de Vermoim. E é gente com alguma vulnerabilidade sobre o ponto de vista de saúde e sobre o ponto de vista de questões estruturais em casa. O município também nos forneceu, a meu pedido, num programa que eu sei que tem, máscaras para eu poder ensinar e obrigar a usar, porque muitas não têm a competência necessária para perceber que é muito importante. Há sempre aquelas questões como “eu não tenho dinheiro para comprar” e não têm mesmo. Assim eu vou dando e verificando quando já estão a usar uma máscara suja. Portanto há aqui um trabalho didático, vá, que eu faço, mas que para acontecer preciso do apoio do município que tem sido muito importante.
NM: A zona envolvente do Centro Comunitário tem sofrido uma profunda reabilitação. Já existem espaços de fruição de lazer, públicos, e o novo Centro Comunitário ficará inserido na chamada praça do oxigénio. Sabe se existe perspetiva para o início da obra e de que forma é que isso poderá vir a afetar o trabalho do Centro?
MF: É exatamente esse o ponto. Nós continuaremos a fazer o nosso trabalho e de uma forma mais alargada. Neste momento, com as obras de reabilitação do bairro, os muros foram todos demolidos, incluindo os muros que rodeavam o centro comunitário. Isso foi uma atitude muito importante para as pessoas que residem aqui à volta, que também beneficiariam e que algumas já beneficiam, dos nossos serviços, nomeadamente ao nível da área das atividades ocupacionais, que vão desde a música ao desporto, que é para toda a gente, não é só para pobres. O que acontecia é que, devido ao estigma que o bairro tinha, havia uma certa relutância em entrar no Bairro do Sobreiro, porque tinham de entrar para vir aqui ao Centro Comunitário. Confessavam-me isso mesmo. Ora, com a demolição em primeiro lugar destes muros e consequente abertura de arruamentos, espaços de jardim para fruição coletiva, etc, tem-se vindo a desestigmatizar o Sobreiro, e a permitir que as pessoas se sintam mais confortáveis em estar aqui na área. Inclusivamente isto vê-se, passeiam, vêm brincar com os meninos, vêm andar de bicicleta, e alguns já vêm ao Centro Comunitário porque percebem que aquela ideia de que é só para pobrezinhos, para pessoas muito más, não é nada verdade. Nunca foi! Por exemplo no nosso grupo coral, que é um grupo já reconhecido, vamos muitas vezes fazer concertos à Casa da Música, temos um disco editado, já temos gente que não é do Sobreiro. O novo Centro Comunitário vai promover uma melhor interação com a comunidade alargada, que é o que se pretende. É isso que queremos. É eliminar o gueto. Os guetos, quer sociais, quer estruturais. Vamos passar a ter condições que não temos aqui, nomeadamente na área do teatro, do cinema, das artes plásticas, performativas, plásticas, etc, que já fizemos em tempos nos anos 90, com grande impacto. Trabalhamos com muitos jovens, alguns dos quais seguiram carreiras de músicos, de artistas, mas o mais importante é que estas atividades contribuíram par o seu crescimento e maturação de forma eficaz. Portanto, no novo Centro Comunitário, como fica mesmo numa área de confluência de vários arruamentos importantes de acesso à cidade, vamos trabalhar de uma forma muito mais fácil com toda a gente. E a partilha de todos os saberes é o que enriquece a comunidade.
NM: Quem quiser entrar em contacto com o Centro Comunitário porque está a precisar de algum tipo de apoio, como é que o pode fazer?
MF: Há três maneiras. Uma é vir cá. Estamos aqui mesmo no centro da cidade e serão sempre bem recebidos, seja para o que for. A segunda é por email: centrocomunitá[email protected].
A terceira é ir ao nosso Facebook que eu respondo na hora. Uma dúvida, uma necessidade, seja do que for, ou respondemos ou encaminhamos. Ou se quiser ainda, por telefone através do 229483927.