No passado mês de Janeiro, o Syriza de Alexis Tsipras, ganhou as eleições legislativas gregas, com um programa basicamente assente num forte combate às políticas de austeridade, que o Governo então liderado por Antonis Samaras, do partido Nova Democracia, tentava implementar. Medidas de austeridade essas, que por sua vez, resultavam do cumprimento de um programa de assistência económica e financeira a que a Grécia se encontrava sujeita, similar ao que havia sido promovido em Portugal pelo FMI, BCE e Comissão Europeia, ou seja, pela famosa “Troika”. Recordo, que entre as medidas mais simbólicas então prometidas pelo Syriza, estavam a reestruturação da dívida pública e a reposição do salário mínimo nos 751 euros.
Passados seis meses, a Grécia está em incumprimento com os seus credores internacionais, os bancos encontram-se temporariamente encerrados, o salário mínimo continua nos 580 euros mensais e a Grécia está a caminho de um terceiro resgate.
Pelo meio, depois das mais diversas negociações desenvolvidas com os seus credores internacionais, com o FMI e com os líderes da União Europeia (todas sem qualquer sucesso…), assistimos à demissão do carismático ministro das Finanças, Yanis Varoufakis. Na sequência aliás, de um Referendo ao povo grego, cujo resultado, aparentemente até relegitimava a sua vontade e estratégia, e naturalmente, também do Governo liderado pelo Syriza, de quem Varoufakis era um actor principal…
Ou seja, passados seis meses, o Syriza, na liderança dos destinos do povo grego, nada conseguiu concretizar de relevante do que prometeu nas eleições do início do ano, tendo a sua governação até agravado de forma substancial, a já frágil situação social, económica e financeira da Grécia.
E sobre a saída do então ministro das Finanças, Varoufakis, o Primeiro- ministro Alexis Tsipras comentou, recentemente, que o antigo responsável pelas Finanças do seu Governo “cometeu erros” e que “ser um excelente académico não faz necessariamente um bom político”.
Sendo que a verdade, é que uma semana depois de ter substituído Varoufakis, o Governo liderado pelo mesmo Alexis Tsipras, e já com um novo responsável na pasta das Finanças, Euclid Tsakalatos, acabou por negociar um novo Resgate com o FMI, o BCE e a Comissão Europeia, num valor superior a 80 000 milhões de euros e que sujeita o povo grego a medidas de austeridade bem mais duras do que aquelas que o Governo então liderado por Antonis Samaras e pela Nova Democracia, procurava implementar há alguns meses atrás!…
Pergunta-se agora, o Syriza e os seus responsáveis Alexis Tsipras e Yanis Varoufakis, mentiram ao povo grego aquando da apresentação do seu programa eleitoral, e que os conduziu à liderança dos destinos da Grécia, no início do ano?
Sinceramente, tenho hoje as maiores reservas. O Syriza é um partido de extrema-esquerda, e Alexis Tsipras e o próprio Varoufakis, sempre me pareceram muito críticos do actual modelo de projecto europeu e, designadamente, contra a permanência da Grécia no “Euro”. Pelo que estamos perante uma postura, que no essencial, sempre assentou em questões de ordem ideológica. E a que Tsipras e Varoufaquis, de forma mais ou menos temerária, e até, aqui e ali, irresponsável…, tentaram obedecer e dar cumprimento.
O problema é que a realidade, por muito que custe, é sempre a realidade. E entre o querer e o poder existe quase sempre uma grande distância. E não podemos esquecer, que o mesmo também sucede entre o querer e o dever.
O Syriza e os seus responsáveis apostaram tudo na reestruturação da dívida grega (com mais um perdão, pelo meio…), convencidos que os credores internacionais jamais ousariam experimentar as consequências de uma eventual saída da Grécia da “Zona Euro” e de que a força da legitimidade do voto, oferecida de forma clara pelo eleitorado grego, lhes garantia uma decisiva vantagem negocial. Arriscaram tudo, esticaram a corda até ao limite, mas temos de reconhecer, sem qualquer sucesso.
A realidade foi mais forte e impôs um caminho diferente. “Assinei um acordo em que não acredito, mas estou pronto a implementá-lo”, referiu
Tsipras. Tendo reconhecido que a alternativa era a saída do “Euro” e a bancarrota desordenada. Sendo que a Grécia não tem “reservas suficientes para regressar a uma moeda nacional”, reconheceu ainda o líder do Syriza.
Ironicamente, o acordo que Alexis Tsipras subscreveu, mas em que não acredita (como uma boa parte dos demais responsáveis do Syriza), mereceu o aplauso da Comissão Política da Nova Democracia, que o descreveu como “doloroso, muito pior do que o que existia até agora”, mas “necessário para evitar uma catástrofe”.
Nestes seis meses de governação, podemos assim concluir que Alexis Tsipras tentou agir de acordo com as suas convicções ideológicas, e no sentido de corresponder à vontade do eleitorado que legitimamente sufragou o seu programa de governo. Pelo que mesmo que discordemos das suas opções, teremos de reconhecer que tentou ser coerente e consequente. Todavia, a partir do momento em que assina um acordo em que não acredita, e que contraria frontalmente o seu programa de governo, Tsipras para continuar a ser coerente e consequente, não tinha alternativa que não fosse a apresentação da sua demissão, como Primeiro-ministro. Ao não o ter feito,Tsipras perdeu o crédito do reconhecimento ideológico e banalizou o mandato que o povo grego lhe havia confiado.
Paulo Ramalho
Vereador do Desenvolvimento Economico e das Relações Internacionais da Câmara Municipal da Maia