Numa agradável noite de Junho do ano passado, tive a honra de moderar uma “tertúlia” memorável entre dois históricos do PSD, Amândio de Azevedo e Bernardino da Costa Pereira, perante algumas dezenas de militantes do Partido, que então se dirigiram à sede da “Pinta” para falar de Sá Carneiro e os primeiros anos do PSD/Maia.
Ambos militantes do então PPD desde a sua fundação, Amândio de Azevedo e Bernardino da Costa Pereira desempenharam diversos cargos no Partido, tendo o primeiro sido, designadamente, Presidente do Conselho Coordenador do Porto em 1974 e Secretário-geral em 1978 e o segundo, Presidente da Comissão Instaladora da Secção da Maia em 1974 e, posteriormente, presidente da Comissão Política do PSD/Maia em diversos mandatos.
Falou-se dos famosos deputados da “Ala Liberal” (1969-1973), da SEDES (Associação para o Desenvolvimento Económico e Social, criada em 1970), do papel da cidade do Porto no nascimento do Partido, do “Expresso”, do famoso comunicado da constituição do Partido de 6 de Maio de 1974, do PREC, dos primeiros “comícios “e “sessões de esclarecimento”, da mudança de nome em Outubro de 1976, para “Partido Social-Democrata”, da ruptura provocada pela saída do grupo dos “inadiáveis”, da primeira Comissão Politica do PPD/Maia liderada por Elísio Costa e até das secretas reuniões, a propósito do exilio do Bispo do Porto… Mas duas realidades marcaram a discussão daquela noite: a incontornável figura de Francisco Sá Carneiro e a matriz ideológica do PPD/PSD.
Com efeito, apesar de ter falecido apenas seis anos e alguns meses depois do nascimento do Partido, e de não ter estado sequer durante todo esse tempo na liderança do mesmo, Sá Carneiro é ainda hoje, volvidos 40 anos, uma referência maior do PSD, uma espécie de líder natural para toda a vida, e ao mesmo tempo, reserva moral e ideológica do Partido. Sendo comum ouvir-se entre militantes e simpatizantes menos satisfeitos com as lideranças ou rumos actuais, “este já não é o Partido de Sá Carneiro”…Mesmo entre jovens que apenas o conheceram pelos escritos e pelas simples imagens dos vídeos…
Determinado, de convicções firmes, combativo, de discurso fácil e raciocínio rápido… de facto, Francisco Sá Carneiro era uma daquelas personalidades a que ninguém conseguia ficar indiferente. Tendo-se tornado num líder carismático, temido pelos adversários e fortemente mobilizador de “seguidores”. E como recordava Amândio de Azevedo, de tal forma, que muitos aderiram ao então Partido Popular Democrático, mais pela personalidade carismática de Sá Carneiro, do que pela identidade ideológica do Partido.
Quanto à matriz ideológica do PSD, e apesar de Sá Carneiro a certa altura ter definido o então PPD como um “partido de centro-esquerda, baseado nos ideais da social-
democracia europeia”, a verdade é que é uma discussão que parece não ter fim à vista. A investigadora americana Maritheresa Frain, por exemplo, defende que” o PPD/PSD é um partido político que nasceu na direita, rapidamente se moveu para o centro-esquerda, por exigências da conjuntura política nacional, e regressou para o seu posicionamento natural, no centro-direita do espectro político”…
Por sua vez, Marcelo Rebelo de Sousa, situa o nascimento do PPD, do ponto de vista ideológico, na confluência de três legados: “social-cristão, social- liberal com afloramentos democráticos e social-tecnocrático (com imperativos de desenvolvimento e justiça, e privilegiando as mudanças económicas, sociais e culturais como meio determinante de promover e alargar a democracia).” Sendo que sempre se vislumbrou em Sá Carneiro um particular “entusiasmo pelas sociais-democracias nórdicas”…
Muitos outros, entendem simplesmente que o PSD não se pode definir ideologicamente com base numa perspectiva de sentido único, sendo todavia o partido mais português do panorama político nacional.
Enfim, foi uma tertúlia de verdadeiros sociais-democratas, que procuraram o reencontro com a história, para a melhor compreender e homenagear.
Paulo Ramalho
Conselheiro Nacional do PSD