As eleições europeias do passado dia 26 ofereceram aos 10. 786 049 portugueses, então inscritos nos cadernos eleitorais (território nacional e estrangeiro), 17 opções, tantas quantas as forças políticas que se encontravam descritas nos boletins de voto. De todos os inscritos, apenas 3. 314 423 portugueses exerceram o seu direito de voto, tendo contribuído com a sua vontade para que o PS elegesse nove deputados para o Parlamento Europeu, o PSD seis deputados, o BE dois deputados, o PCP-PEV dois deputados, o CDS/PP um deputado e o PAN um deputado. Sendo que estes seis partidos que elegeram deputados receberam no total 83,29% dos votos, tendo os demais onze partidos apenas merecido a confiança de 9,77% dos cidadãos eleitores.
Daí que qualquer análise aos resultados destas eleições, que tiveram naturalmente vencedores e vencidos, terá necessariamente de começar, antes de mais, pelo facto mais relevante, que com todo o respeito por opinião contrária, é obviamente a reduzida participação dos portugueses. Apesar do incessante apelo ao voto, inclusive do próprio Presidente da República, apenas votaram 30,73% dos cidadãos eleitores inscritos, a mais alta abstenção de sempre.
Ou seja, 69,27% dos portugueses com capacidade eleitoral não votaram, não prestaram qualquer contributo para a escolha dos seus representantes no Parlamento Europeu. Por outras palavras, 69,27% dos potenciais eleitores nacionais não se sentiram mobilizados a votar em nenhuma das aludidas 17 forças políticas. Ainda por outras palavras, os vinte e um deputados portugueses do Parlamento Europeu foram eleitos por apenas 30,73% dos cidadãos eleitores.
Tudo isto em contraciclo com o verificado na maioria do Estados- membros da União Europeia, onde a abstenção desceu de forma significativa, tendo ficado nestas últimas eleições abaixo dos 50%. Aliás, com uma participação abaixo dos 40%, para além de Portugal, apenas 8 países: Bulgária, República Checa, Croácia, Eslováquia, Eslovénia, Estónia, Letónia e Reino Unido.
É evidente que muitas explicações podem ser adiantadas. Desde logo que em Portugal não há fenómenos relevantes de radicalismos populistas, de extrema-direita e eurocépticos, ou problemas graves com migrantes, como em muitos dos países da UE. Que os portugueses até estão relativamente satisfeitos e acham que o seu voto conta pouco para o futuro do projecto europeu…
Seguramente que são argumentos a considerar. Mas, sinceramente, estou convencido que a fraca participação dos portugueses nas últimas eleições europeias revela acima de tudo um reduzido conhecimento dos cidadãos nacionais sobre o projecto da União Europeia, e designadamente pela sua importância no seu presente e futuro colectivo. Isto num país, como é o nosso, onde os fundos da UE mais pesam no investimento público nacional.
E sejamos claros, a campanha eleitoral também não ajudou, pois foi muito mais dominada por temas de ordem nacional do que pelas grandes questões europeias.
Por outro lado, não tenhamos dúvidas, a fraca participação dos portugueses nas eleições do passado dia 26 de Maio, traduz também a crescente crise que se vem sentindo na relação de confiança entre os cidadãos e os partidos políticos nacionais. E sejam elas quais forem as razões, a sensação que se tem é que os partidos não estão a conseguir responder com eficácia às expectativas dos cidadãos. Nem os partidos tradicionais, nem as novas forças políticas.
Sendo que é bom que os partidos percebam que apesar de “para ganhar basta ficar à frente”, a legitimidade política da representação é tanto maior quanto maior for a participação dos cidadãos eleitores. Daí que não seja exactamente igual ser eleito num acto em que apenas votaram 30% dos eleitores ou numas eleições em que participaram mais de 50% dos cidadãos. E a política, designadamente a sua força legitimadora, também vive de sinais.
Este é um assunto que não deve ficar apenas pelo lamento nem pela simples reflexão. E se é verdade que todos devemos assumir as nossas responsabilidades, é importante que os partidos assumam desde já a dianteira, sob pena de estarem a contribuir para a sua progressiva irrelevância. É que a verdadeira autoridade não é aquela que julgamos ter ou que nos conferem os estatutos, mas aquela que nos reconhecem os outros.
Chegados aqui, logo teremos de concluir que a reflexão sobre quem ganhou ou perdeu nas últimas eleições europeias, estará sempre condicionada pelo reduzido número de portugueses que participaram nas mesmas. Pois, como supra referimos, sabemos qual a vontade de 3.314 423 portugueses que votaram, mas não conhecemos a opinião dos demais 7.471 626 portugueses que optaram por não exercer o seu direito de voto.
Ainda assim, os vencedores destas eleições foram claramente o PS, o BE e o PAN. O Partido Socialista, porque alimentado por um discurso de António Costa que sugeria serem estas eleições, uma espécie de “moção de confiança ao Governo”, foi a força politica mais votada, com 33,38% dos votos expressos, o que lhe permitiu eleger mais um deputado do que nas últimas eleições europeias ocorridas em 2014. O Bloco de Esquerda, porque com um discurso menos radical e mais europeísta, protagonizado por Mariza Matias, conseguiu eleger mais um deputado que em 2014. E o Partido Pessoas Animais Natureza, fundado apenas em 2009, porque com 5,08% dos votos, alcançou pela primeira vez a eleição de um deputado para o Parlamento Europeu, ocupando de alguma forma o lugar do MPT de Marinho e Pinto, que em 2014, com 7% dos votos, elegeu mesmo dois deputados.
Do lado dos vencidos, o PCP-PEV, o PSD, o CDS/PP e o Aliança. O Partido Comunista Português e o Partido Ecologista Os Verdes, porque mais uma vez coligados, perderam um deputado relativamente a 2014, parecendo estar a sofrer a erosão do apoio ao Governo socialista e de um discurso ainda muito ortodoxo e menos atraente, designadamente para os mais jovens. Os Sociais-democratas e Centristas, porque apesar de terem mantido o mesmo número de deputados eleitos que em 2014, obtiveram um resultado claramente abaixo das suas expectativas, como reconheceram os próprios líderes, Rui Rio e Assunção Cristas.
Sendo que o Partido Social Democrata até à denominada “crise dos professores” (em que António Costa ameaçou com a demissão do Governo caso o parlamento aprovasse a contagem integral do tempo de serviço dos professores) parecia muito perto do Partido Socialista nas intenções de voto. Com efeito, no final de Abril, um estudo da Aximage para o Jornal de Negócios e Correio da Manhã, atribuía 33,6% aos socialistas e 31,1% aos sociais-democratas. Na prática, um empate técnico entre as duas forças políticas.
O Partido Aliança, do ex social-democrata Pedro Santana Lopes, foi mesmo o grande derrotado destas eleições, pois apesar de todas as expectativas, ficou-se apenas pelos 1,86% dos votos, não tendo elegido qualquer deputado.
Não tarda muito, teremos as Eleições Legislativas, já em Outubro próximo. Vamos ver se o PAN é apenas um partido de protesto, se o Aliança cresce e se o PSD afirma-se mesmo como alternativa. É que nem tudo que “reluz é ouro”. E a degradação dos serviços públicos é cada vez mais uma evidência, a dívida pública nacional, em termos absolutos, não pára de crescer e os portugueses continuam com a maior carga fiscal de que há memória.
Paulo Ramalho