Numa altura em que a Câmara da Maia vai injetar dinheiro na economia local, através de um programa de apoio direto às empresas, o NOTÍCIAS MAIA entrevistou Paulo Ramalho, vereador da Economia do município. Será suficiente? Vão ser criados mais apoios?
Numa altura em que estamos a passar por um segundo confinamento, a incerteza e a volatilidade paralisam uma grande parte da nossa economia e, segundo o vereador Paulo Ramalho, a situação das empresas nacionais poderá ser mais precária e problemática, uma vez que apenas 3% do PIB foi para medidas de apoio direto às empresas, quando a França e a Alemanha gastaram valores na ordem do 5% e 8%, respetivamente.
NM: Quais as principais dificuldades apontadas pelas empresas?
PR: Há uma preocupação comum a todas as empresas que se relaciona com o grau de incerteza que nesta altura todos vivemos, relativamente ao caminho e evolução da pandemia. A confiança é um elemento essencial na economia, designadamente na tomada de decisões, e o grau de incerteza, agravado por esta terceira vaga, está a deixar muitas empresas mais inseguras e menos disponíveis para o investimento e para o risco de lutar pela sobrevivência. O momento do términus da pandemia e o regresso à normalidade, apesar de se ter já iniciado a vacinação, não tem ainda prazo certo. Daí que planear num horizonte superior a curto prazo, com alguma segurança, é hoje uma dificuldade maior. Por exemplo, não tenho dúvidas que a restauração, os ginásios e os cabeleireiros, só para falar nestes três sectores, não esperavam de todo este novo confinamento, até porque o Governo sempre tinha assegurado que não haveria outro confinamento como o de Abril do ano passado. Todavia, de um momento para o outro, a realidade transformou-se e tudo mudou. E sem receitas e com despesas fixas para pagar, as empresas ou recorrem a poupanças que tenham ou o único caminho é o do endividamento. Gostava sinceramente de estar enganado, mas pressinto que apesar da resiliência dos nossos empresários, muitas empresas vão ser obrigadas a fazer reestruturações, com diminuição de postos de trabalho e outras vão mesmo desaparecer. A propósito, recordo que as insolvências aumentaram no nosso país cerca de 12% só nos primeiros nove meses de 2020. E a AHRESP, que é a associação que representa o sector da hotelaria, restauração e similares, anunciou recentemente que cerca de 39% deste sector está em risco de insolvência. Porém, é importante que se diga, que no meio desta crise, há empresas mais penalizadas do que outras, e até empresas que têm visto crescer os seus resultados, e outras ainda que viram nesta crise uma oportunidade, como foi o sector ligado ao digital. Por outro lado, se é verdade que todas as empresas que se viram obrigadas a diminuir ou mesmo interromper a sua atividade durante os períodos de confinamento geral estão com dificuldades, ou mesmo com muitas dificuldades, também é verdade que sectores como a construção civil, bem como uma boa parte da indústria, têm passado com relativo sucesso por esta crise. Recordo aliás, que em Abril e Maio, com as interrupções das cadeias de consumo a nível mundial, Portugal viu as suas exportações diminuírem cerca de 39%, sendo que em Novembro último, a quebra já se situava apenas em 0,4%. E no que concerne às exportações com origem nas empresas da Maia, assistimos mesmo a uma subida de 14%, relativamente a Novembro de 2019. Agora, quando nos viramos para a fileira do turismo e de toda a atividade empresarial que lhe está direta e indiretamente associada, o panorama é mesmo muito complicado. Este sector sofreu, só na região norte, entre Janeiro e Outubro de 2020, um decréscimo de cerca de 61% do seu volume de negócios. Na mesma linha, e no mesmo período, o Aeroporto Francisco Sá Carneiro, que se encontra instalado precisamente aqui na Maia, sofreu um decréscimo de passageiros na ordem dos 64%. No meio disto tudo, há empresas que aproveitaram para se reinventar, procurando novas soluções. Assim se passou com a restauração, com um claro desenvolvimento do take away e do delivery, e com o comércio a retalho e o recurso a plataformas digitais de promoção e venda. Sendo que a maior parte das empresas continua a reclamar mais apoios do Estado…
NM: As medidas de apoio, instituídas pelo o Governo, são insuficientes?
PR: Antes de mais, é importante que se diga, que Portugal é um dos países da União Europeia que menos tem investido no combate à crise económica provocada pela pandemia, em percentagem do PIB. Fazendo uma rápida comparação, Portugal gastou em 2020 cerca de 3% do seu PIB em medidas de apoio direto às empresas, quando a França e a Alemanha gastaram valores na ordem do 5% e 8%, respetivamente. O nosso Governo apostou essencialmente, designadamente na primeira parte da pandemia, num modelo de apoios assente em créditos e moratórias, ao contrário de outros países, que seguiram outros caminhos, privilegiando subvenções a fundo perdido. O lay-off simplificado é uma medida interessante, que ajuda a manter, ainda que formalmente, os postos de trabalho, mas que no final do apoio não garante que o destino desses trabalhadores não seja mesmo o desemprego. Com efeito, o recurso ao crédito pelas empresas e o adiamento no cumprimento das suas obrigações, vai necessariamente criar ainda mais endividamento nas empresas, o que tudo no final pode resultar em mais dificuldades, e suspeito mesmo, mais insolvências. Parece-me sinceramente que as medidas do Governo foram insuficientes e que o caminho podia e devia ser outro. E sejamos claros, mais insolvências e mais desemprego, vai necessariamente significar menos receita fiscal e mais despesa pública. Estou convencido que a injeção de mais capital a fundo perdido na economia iria ajudar as nossas empresas a ser mais resilientes e mais capazes de participar ativamente na retoma da economia, e consequentemente, a ajudarem na aceleração do crescimento económico do país, que todos desejamos. E independentemente de tudo, temos de reconhecer, que obrigar as empresas a encerrar a sua atividade, durante os períodos de confinamento obrigatório, em detrimento de outras, sem as compensar pelo menos relativamente ao conjunto dos seus custos fixos, não é propriamente uma medida de justiça, mesmo que em tempos excecionais, como é claramente o atual….É que sem atividade, essas empresas não têm qualquer capacidade de gerar receitas que suportem as suas despesas fixas. E sem liquidez, resta-lhes o endividamento, e muitas vezes, o incumprimento…
NM: A saúde financeira do município é um fator determinante para a possibilidade de conceder apoio direto às empresas maiatas?
PR: É evidente que o facto do Município ter as suas contas equilibradas, ajuda. O próprio presidente Silva Tiago ainda recentemente sublinhou que o orçamento que aprovamos no final do ano para 2021 é o maior da história do Município da Maia. Mas a verdade é que, num momento como aquele em que estamos a viver, de grave crise social e económica, a Câmara Municipal não poderia deixar de estar solidária com as dificuldades que as famílias, as instituições e as empresas da Maia estão a passar. Também não podemos esquecer a importância que o tecido empresarial tem prestado ao desenvolvimento do nosso território, bem como o contributo decisivo para os níveis de emprego do nosso concelho. Recordo que em 2019 a derrama representou cerca de 12% das receitas correntes do Município. Todavia, devo também referir, que em matéria de apoios à economia, as competências legais do Município são algo limitadas, podendo apenas acontecer em momentos de exceção, e de forma complementar às medidas do Estado central, designadamente quando as mesmas se afigurem insuficientes, como é o caso. Sendo que queremos apoiar a manutenção da atividade das empresas que estão mais necessitadas, mas obviamente contribuir para que as mesmas possam manter os seus níveis de empregabilidade. Agora, é verdade, que enquanto o Estado central beneficia de fundos da União Europeia para apoiar a economia nacional, este programa lançado pela Câmara Municipal de apoio às empresas do concelho está assente exclusivamente em fundos municipais.
NM: Quando vão ser pagas as subvenções do Programa de Apoio Direto à Economia?
PR: Bom, aprovado na Assembleia Municipal, o regulamento deste Programa de Apoio Direto à Economia foi para publicação em Diário da República e entrará em vigor durante a primeira semana de Fevereiro. As empresas e empresários em nome individual que preencham os requisitos para beneficiar do apoio, devem apresentar a sua candidatura de forma digital através do site oficial do Município da Maia (www.cm-maia.pt), o que deverão fazer obrigatoriamente durante os meses de Fevereiro e Março. O apoio será pago à empresa beneficiária em duas prestações, a primeira nos trinta dias seguintes à aprovação da candidatura, e a segunda, dois meses após o pagamento da primeira prestação. Recordo que este apoio consiste numa subvenção não reembolsável, vulgo a fundo perdido, correspondente ao montante de 635 euros por cada trabalhador da empresa, com o valor máximo de 7.000 euros a atribuir por empresa. Gostava de acrescentar ainda que este programa vai ser gerido pelo Gabinete de Apoio ao Investimento e Relações Internacionais da Câmara Municipal, mas vai ser auditado por entidade externa competente.
NM: Qual a percentagem de empresas maiatas que estima estarem abrangidas pelo programa?
PR: Em bom rigor não lhe posso dar um número seguro. Apenas lhe posso dizer que este programa tem uma dotação global de um milhão e duzentos mil euros, e destina-se a apoiar as micro e pequenas empresas, bem como os empresários em nome individual da Maia, que mais foram afetados pela crise económica provocada pela pandemia durante o ano de 2020, designadamente que tenham tido uma redução no seu volume de negócios igual ou superior a 35% relativamente ao ano de 2019. Sendo também requisitos obrigatórios que não tenham tido em 2019 uma faturação superior a 350.000 euros e subscrevam o compromisso de manter o número de postos de trabalho que possuíam em Dezembro de 2020. As atividades económicas contempladas constam do anexo do regulamento e vão desde a fileira do turismo, comércio a retalho, restauração, alojamento, pequenos serviços, atividades de bem- estar e cultura. Na construção deste Programa foi ouvida a Associação Empresarial da Maia.
NM: Vivemos um segundo confinamento que agravará a situação das empresas. Estão a ser considerados outros apoios extraordinários?
PR: Essa é uma pergunta particularmente pertinente. De facto este programa foi desenhado num momento em que não se perspetivava um confinamento como aquele que estamos nesta altura a viver e que paralisou novamente uma boa parte da economia. Mas obviamente que todos sabemos que os tempos atuais são de grande incerteza e volatilidade, e naturalmente que a Câmara e o seu presidente estão a prestar toda a atenção ao evoluir da situação e não deixarão de promover as devidas respostas caso assim se afigure necessário. Aliás devo dizer, que temos em carteira outras soluções para promover o consumo no nosso comércio local, que neste momento não podem ser concretizadas dada a imposição de confinamento, mas que pretendemos implementar logo que possível.
Aldo Maia e João Loureiro.