A poucas semanas de se conhecer a proposta de Orçamento do Estado do Governo para 2019, começam as especulações sobre qual vai ser a postura do BE e do PCP, se desta vez, o vão viabilizar ou não. Ou seja, se a dita “geringonça” vai continuar o seu caminho ou se vai colocar desde já termo ao seu destino e entregar a alma ao criador. É que este é o último Orçamento do Estado da legislatura, e com o fim desta morre necessariamente a geringonça e os partidos que a constituem ganham novamente vida própria. Vão individualmente a eleições, cada um com os seus próprios argumentos e todos lutando e competindo entre si pelo melhor resultado…
Não podemos olvidar que esta “coligação” parlamentar que suporta o actual Governo de António Costa não surgiu propriamente de uma grande identidade programática entre PS, BE e PCP, mas de uma simples vontade comum de impedir que PSD e CDS/PP, estes sim, à época “verdadeiramente coligados”, e que haviam ganho efectivamente as eleições, continuassem a governar o país.
E se é verdade, que tal coligação de esquerda algo contra-natura e até demasiado circunstancial, parecia condenada a não ter vida longa, forçoso será reconhecer que a dita geringonça conseguiu cumprir com sucesso o seu objectivo principal. E hoje, António Costa e o PS governam o país com relativa tranquilidade. E o BE e o PCP, não estando no Governo, condicionam claramente a sua acção.
Não foi por acaso que que no “Debate da Nação” do passado dia 13, Pedro Filipe Soares do BE questionou António Costa se a geringonça ainda estava no “coração do PS” e o Primeiro-ministro respondeu que estava no “coração e na cabeça”. E o próprio secretário-geral do PCP, Jerónimo Sousa, reconheceu no mesmo debate que “a vida avançou no bom sentido”, sem deixar de questionar o Governo se este estaria disponível para “levar mais longe a reposição de direitos ou travar o passo…”
Claro que podemos e devemos questionar se o país com a geringonça avançou verdadeiramente no bom sentido. Se hoje estamos melhor do que em 2015. Ou se poderíamos estar ainda muito melhor do que efectivamente estamos. É que em 2015 tínhamos acabado de sair do programa de ajustamento imposto pela Troika. E os últimos quatro anos têm sido tempos de prosperidade e crescimento dentro do espaço da União Europeia. Daí que se imponha uma breve análise, pelo menos a alguns “números”.
A nível do emprego, não há dúvidas que hoje estamos melhor. Apesar dos valores do desemprego jovem se manterem ainda muito elevados, segundo o INE, a taxa de desemprego, em termos globais, atingiu no primeiro trimestre deste ano o valor mais baixo desde 2008, precisamente 7,9%.
O défice das contas públicas continua a sua trajectória descendente, prevendo o Governo que no final de 2018 chegue mesmo aos 0,7%, o que é aparentemente um bom caminho. A questão é se tal resultado não estará demasiado influenciado por uma carga fiscal excessiva e pelos reduzidos níveis de investimento público e pelas cativações que, em alguns casos, parecem estar a levar a uma clara degradação da qualidade dos serviços públicos. Recorde-se que o INE confirmou, recentemente, que a carga fiscal em Portugal atingiu em 2017 o valor mais elevado dos últimos 22 anos.
Quanto ao crescimento económico, o Governo prevê para 2018 um valor na ordem dos 2,3% do PIB, inferior ao do ano passado é certo, que se situou em 2,7% do mesmo PIB. Mas ainda assim, estamos a falar de crescimento, o que é sempre positivo. A questão é se não deveríamos hoje estar confrontados com um crescimento de maior dimensão. Recorde-se que com o valor previsto pelo próprio Governo de António Costa, Portugal deverá registar no final deste ano o 5º crescimento económico mais baixo entre os 28 países da União Europeia, o que é claramente pouco ambicioso e nada animador.
Relativamente à dívida pública nacional, que segundo o Banco de Portugal, em Maio do corrente ano, atingiu um novo máximo em termos brutos, de 250.313 milhões de euros, batendo o máximo de 250.296 milhões de euros, registado em Agosto do ano passado, é que não se vislumbra qualquer sucesso da actual governação, sendo muito preocupante o seu constante crescimento. E que a continuar neste caminho, faz-nos sentir a presença de fantasmas do passado com que ninguém de bom senso se quer voltar a encontrar.
Tudo isto numa época de “juros negativos” e em que o Banco Central Europeu continua a comprar dívida pública. E em que o preço do barril de petróleo, que já andou pelos 45 dólares em 2017, ameaça hoje os 80 dólares!
É evidente que a situação económica e financeira do país está longe de ser a desejável e as perspectivas não são as melhores. E sabem-no bem também os partidos da geringonça. Não foi por acaso que no recente “Debate da Nação”, o líder do PCP, Jerónimo Sousa, desafiou o Governo a “romper com os constrangimentos da submissão ao Euro e do serviço de uma dívida insustentável”…
Sucede é que nesta altura a táctica política já tomou conta da situação e o BE e o PCP têm a clara convicção que os partidos que viessem agora provocar uma eventual crise política seriam fortemente penalizados pelos portugueses nos actos eleitorais do próximo ano, em benefício do PS e de António Costa. Razão pela qual o BE e o PCP não têm alternativa que não seja viabilizarem o próximo Orçamento do Estado, e até porque já perceberam que o Governo lhes vai dar os argumentos necessários, ao projectar para 2019 um aumento generalizado do investimento público.
Aliás, António Costa, além de já ter prometido um “orçamento de continuidade”, já indiciou que em 2019, designadamente a Cultura, terá o maior orçamento de sempre…