Recomeçar com 71 rotas a partir de Lisboa e apenas 3 no Porto, numa altura em que está em cima da mesa a hipótese de nacionalizar definitivamente a companhia, não cumpre um desígnio nacional.
Processo de expansão, incremento de passageiros superior a 50% em cinco anos e uma muito esperada modernização da frota de longo curso. Estava tudo aprumado para um ano de sucesso até que, em março, o mundo (da aviação) parou. O cancelamento de voos, a falta de novas reservas e os inevitáveis reembolsos, deixaram a TAP a precisar desesperadamente de se financiar em montantes que podem chegar, no curto prazo, aos mil milhões de euros.
A falta de liquidez e de vendas arriscaria ser igual à de muitas outras empresas, não fosse o pormenor de, em 2016, o Governo de António Costa ter desembolsado o dinheiro dos contribuintes para reverter a privatização da transportadora. Os portugueses ficaram com 50% de uma empresa endividada, aos quais correspondem apenas 5% dos direitos económicos em caso de dividendos. Os restantes 50% estão divididos entre os trabalhadores (5%) e os “donos” privados (45%).
Assim, se a empresa é privada e quer ter um âmbito puramente regional, essa decisão não cabe a mais ninguém senão aos seus donos. Porém, do ponto de vista privado e com o turismo e o setor de aviação em risco de demorarem anos a recuperar, poderá ser até economicamente imoral “despejar” dinheiro em cima de um problema, muito mais ligado ao historial ruinoso de gestão de empresas públicas, do que aos anos em que o consórcio privado está à frente da TAP.
Por outro lado, se a companhia é pública, com as 71 rotas para Lisboa e apenas uma “meia dúzia” no resto do país, é por demais evidente que não se pode falar de uma nacionalização mas sim numa municipalização. Sem qualquer sombra de dúvida, tal e qual como a STCP, o encargo deve ficar na zona servida pela empresa – em Lisboa – e esta pode continuar a alegrar os políticos da capital.
A TAP não é serviço público e o argumento de que é estratégica, além de ser um logro, não pode perpetuar a manutenção de uma empresa que, enquanto foi de todos, não serviu condignamente os portugueses fora da capital, tal como mais uma vez se prepara para fazer.
Aliás, dezenas de companhias aéreas provaram que o país fora de Lisboa não precisa da TAP. Tanto companhias tradicionais públicas e privadas, como low-cost, criaram dezenas e dezenas de rotas nos Açores, na Madeira, em Faro e no Porto, tanto domésticas, como internacionais e até intercontinentais, que com a TAP nunca subsistiram. Deram mobilidade aos Portugueses, impulsionaram o turismo, geraram lucro e pagaram impostos.
Estou certo que os autarcas têm muito a dizer, principalmente os do Norte e especialmente aqueles dos territórios mais próximos do aeroporto. Para já, o que nos separa de uma nova indecência são as vozes dos poucos que, com o seu orgulho e vontade de lutar, já fizeram saber publicamente que não aceitam para os seus menos do que em Lisboa se tem por garantido.
João Loureiro