A decisão de proibir os órgãos de comunicação social do grupo Cofina (Jornal Correio da Manhã e Revista Sábado) de publicar notícias sobre o caso Sócrates é ilegal, inconstitucional e constitui uma forma descarada de censura, tal como acontecia no tempo da Ditadura Militar e do próprio Estado Novo. O vulgo “lápis azul” volvidos quarenta e um anos, está de volta (mas só a alguns jornais e revistas), os princípios do Estado de Direito e do Estado de Direito Democrático conhecem hoje uma crise “existencial”. A decisão é péssima e dela devem retirar-se consequências jurídicas, lógicas e quiçá políticas.
O Eng. José Sócrates e a sua defesa não têm o direito de limitar a liberdade de expressão de ninguém, quer se trate de jornalistas enquanto classe profissional quer seja de um cidadão, ou então de tentar alienar por cerca de trezentos e cinquenta mil euros cada notícia publicada sobre o caso Sócrates, nem mesmo a juíza pode acatar uma pretensão destas, seria um verdadeiro negócio da china à custa da liberdade de expressão e à custa da liberdade de imprensa.
A meritíssima juíza ao fixar sanções pecuniárias compulsórias pelo incumprimento de tal decisão, está a condicionar a liberdade de imprensa do próprio grupo, e a liberdade de expressão que a Constituição da República Portuguesa consagra aos cidadãos. Não consigo entender em que quadro legal é tomada esta decisão uma vez que qualquer cidadão se pode constituir assistente e aceder ao processo penal, não faz sentido absolutamente nenhum que tal seja negado aos órgãos de comunicação social, nem a ninguém…
Destarte em Coimbra, o Doutor Jonátas Machado, afirma que a decisão é inconstitucional explicando também que “a liberdade de expressão transcende o interesse dos seus titulares. Há o princípio da proibição de censura e esse não pode ser ultrapassado.” Também o Doutor Costa Andrade, um dos autores do Código de Processo Penal, declara que a providência cautelar, sem que os órgãos envolvidos tenham sido auscultados, é um acto de “censura prévia” e inconstitucional: “Proibir de forma preventiva dar notícias sobre qualquer área específica é inconstitucional a vários níveis: viola a liberdade de imprensa como instituição irrenunciável do Estado de direito democrático; viola o direito da comunidade a ser informada; e viola o direito de os jornalistas expressarem livremente o seu pensamento, fazer investigação dos factos e dar notícia dos mesmos.”
Em suma, tanto neste país se lamentou “je suis charlie” e quando o cenário em Portugal é este, lamentavelmente não vejo indignação ou pelo menos a que seria expectável num ataque grosseiro e implacável à liberdade de expressão globalmente considerada, à liberdade de imprensa autonomizada e ao princípio do Estado de Direito Democrático.
Não basta ter Abril e o seu “espírito” na boca, é necessário tê-lo no coração e defender o legado deixado pelos Homens, que lutaram acerrimamente para que eu possa redigir este texto, para que eu possa exprimir a minha opinião, agrade ou não ao sistema , é assim em Democracia, por muitas limitações que este sistema político padeça, eu não conheço nenhum melhor, não há outro que assegure as liberdades e as garantias que conceba o cidadão como titular de direitos fundamentais, até mesmo inalienáveis como é caso da própria vida. Citar Voltaire é sempre intemporal e prudente: “Eu discordo do que você diz, mas defenderei até a morte o seu direito de dizê-lo.”
O autor não escreve ao abrigo do novo “acordo” ortográfico.
António Manuel Afonso Mota