O mês de maio foi de desconfinamento e, aos poucos, os negócios locais estão a abrir e a retomar a atividade. Higienização apertada e evitar a aglomeração e o cruzamento de clientes são algumas das estratégias adotadas pelas empresas. Como está a ser feita esta retoma da atividade? Como foi vivida a pandemia nos espaços que mantiveram as portas abertas?
O primeiro Plano de Desconfinamento do Governo definiu para o mês de maio três momentos de reabertura de negócios com diferentes características. Cabeleireiros, livrarias e pequeno comércio local foram os primeiros a ser autorizados a abrir portas no início de maio. No dia 18 seguiram-se os cafés, restaurantes, pastelarias, lojas maiores e foi ainda permitida a montagem das esplanadas. No dia 1 de junho, foi a vez de lojas inseridas em espaços comerciais e, mais recentemente, a abertura de ginásios e similares.
A adaptação à nova realidade
“Nova realidade” é um termo que temos ouvido inúmeras vezes. Não estamos livres da pandemia de Covid-19 e, para voltarmos às nossas atividades, temos de conviver com as máscaras, com o distanciamento social e com a falta do afeto, que nos é tão familiar.Esta “nova realidade” é agora o dia-a-dia dos comerciantes e empresários da Maia.
Depois de quase dois meses de portas fechadas, Sandra Teixeira e Lígia Monteiro puderam reabrir a SL Cabeleireiros & Estética, no dia 4 de maio. Esta paragem significou rendas e pagamentos em atraso e um mês sem ordenados, mas depois de um mês de retoma da atividade, Sandra Teixeira explica-nos que “estão a ter muitas marcações” e “novas clientes”. Lígia Monteiro conta que algumas clientes “tiveram receio no início e não vieram logo na primeira semana”, mas que neste início de junho, as agendas voltam a encher-se tendo em conta a nova limitação de vagas.
As duas profissionais abriram este espaço na Maia há cerca de 7 meses e, quando ainda estavam a trabalhar para recuperar o investimento inicial, o mundo parou. “De um momento para o outro tivemos de fechar e vimos a nossa vida a andar para trás”, conta Sandra Teixeira.
Uso obrigatório de máscara, desinfeção do espaço e limpeza constante passaram a fazer parte da rotina. Um fator que ambas vêm com naturalidade visto que, pela especificidade do negócio, “já tínhamos muito cuidado com a limpeza”.
Treinar pelo ecrã
O remoto passou a fazer parte do nosso dicionário. Muitas empresas enviaram os funcionários para casa e mantiveram o seu posto através do ecrã. Uma solução que não é muito penosa para quem já trabalha usualmente em meio informático. Por outro lado, para quem trabalha com o desporto ou educação física, essa tarefa não é tão fácil.
Maria João Bastos é personal trainer e dona do MStudio, um estúdio de dança, que é também espaço de treino acompanhado. Esteve 81 dias sem abrir o seu espaço mas teve o cuidado de “acompanhar todos os atletas via online”. As aulas de dança também foram mantidas neste formato, mas algumas alunas acabaram por não aderir. Ainda assim, Maria João Bastos considera que este formato está a ser positivo e que “de um modo geral, até se adaptaram bem”.
A proprietária explica-nos que as aulas de dança não podem ser retomadas porque, num espaço como o seu, “seria preciso selecionar quem faz as aulas e isso não é justo”. “Não queremos separar, mas sim integrar”, afirma Maria João Bastos preocupada com o facto de não existir ainda informação mais concreta para as Escolas de Dança poderem retomar a atividade com segurança.
Mesmo sem dança, o MStudio reabriu no início de junho para os treinos personalizados. São três áreas de treino, cada uma com o espaço de mais de três metros quadrados, onde só pode treinar uma pessoa de cada vez (só pessoas do mesmo agregado familiar podem ocupar os três espaços ao mesmo tempo). Vai ser ainda possível treinar ao ar livre.
O investimento em equipamento de proteção foi de 400€. Um valor “significativo para um pequeno negócio”, mas que Maria João Bastos entende como essencial para a retoma da atividade. Todas as pessoas que entram passam por um tapete de desinfeção e um de secagem. As mãos são desinfetadas, as sapatilhas trocadas e não é permitido usar os balneários. Os materiais de treinos são desinfetados no fim de cada treino, as salas arejadas e a profissional está sempre de máscara e viseira. Foi ainda criado um circuito de forma a que a entrada e a saída do espaço sejam feitas por duas portas diferentes.
O tempo que teve o espaço encerrado significou para a MStudio perdas na ordem dos 50%.
Tempo de renovação
No restaurante La Costa Brava, o tempo da quarentena serviu para antecipar algumas obras já pensadas. Durante várias semanas, toda a equipa continuou a trabalhar e a ajudar na remodelação do espaço. O resultado foi um restaurante totalmente remodelado, com uma nova sala que resultou do aumento do espaço e ainda um jardim.
António Sousa, proprietário, parou o negócio mas não parou de trabalhar e ainda acrescentou dois novos pratos à lista.
Sobre a retoma da atividade, explica que tem os cuidados de constante desinfeção do espaço e que toda a equipa usa máscara. Afirma que as pessoas estão “um bocadinho apreensivas” à chegada mas que, depois de entrarem, “sente-se à vontade porque sentem a segurança”.
Na loja d’O Moranguinho os clientes também voltaram a poder visitar a loja. Uma retoma que, para a colaboradora Solange Rodrigues, “está a ser positiva”.
Também aqui a quarentena foi aproveitada para investir mais tempo no online e, inclusive, mantém-se os envios gratuitos “para as pessoas que têm menos à vontade para vir à loja”.
Sobre a segurança, foram tomadas “as medidas necessárias para as pessoas se sentirem confortáveis” e que “as pessoas entram e sentem que não há perigo”. Solange Rodrigues explica que todo o staff anda de máscara, existem acrílicos de proteção, desinfetante para os clientes e, além da limpeza que é feita diariamente, encerram à segunda “para desinfetar tudo mais profundamente”.
Os novos hábitos
Na Taberna Visconti, situada nas galerias Visconde de Barreiros, as portas abriram na segunda fase do desconfinamento mas o movimento está longe de ser o mesmo.
Paulo Ribeiro, proprietário, explica ao NOTÍCIAS MAIA que no período da tarde tem “trabalhado razoavelmente” mas que as manhãs, ou almoços e as noites têm tido muito menos movimento.
“Quem cá vem não tem medo” – Paulo Ribeiro entende que há ainda muitas pessoas “com medo que não saem de casa”, algumas que estão em casa com os filhos e outras tantas em teletrabalho. Estas condições fazem com que a afluência esteja drasticamente reduzida.
Sobre o futuro, o proprietário diz-nos que “isto nunca mais vai ser como era” porque entende que “as pessoas perderam hábitos”.
A coragem de começar no meio da pandemia
Enquanto muitos negócios enfrentam as consequências de uma paragem de longas semanas, há quem se aventure a abrir portas pela primeira vez.
Foi o caso da Loja Cavalinho, na Maia. Rute Alves e Paulo Pinto são os proprietários desta loja franchisada inaugurada a 18 de maio.
A proprietária conta-nos que este é um “desafio que já queríamos fazer há muito tempo” e que “tiveram de se adaptar à situação” visto que o negócio já estava fechado. Sobre a receção dos maiatos, Rute Alves explica-nos que “tem corrido bem” e que as pessoas respeitam bastante as normas de segurança “até porque ainda têm receio de se aproximar”.
A pandemia vista por quem nunca fechou portas
A crise sanitária colocou-nos a todos expostos a este vírus que se sabe mais contagioso do que a maioria. O pedido foi para que ficássemos em casa e para que todos os negócios que não fossem essenciais encerrassem.
Neste sentido, houve quem nunca deixasse de trabalhar. Na Época da Fruta, mercearia local na Maia, as adaptações foram feitas à medida que as recomendações da Direção Geral de Saúde iam sendo feitas.
Aureliano Faria, proprietário, explica-nos que inicialmente foi reduzido o horário de funcionamento e controlada a entrada de pessoas.
Conta-nos que que nessa primeira fase houve uma “corrida desenfreada a alguns produtos” que foi normalizando à medida que era dada mais informação sobre a situação do país.
As máscaras foram entretanto implementadas, primeiramente só para os funcionários mas, numa segunda fase, também para os clientes.
Sobre a possível inquietação dos funcionários, Aureliano Faria explica que no início “foi complicado” mas que agora “estamos mais calmos”. A equipa continuou toda a trabalhar e passou por alguns momentos de maior tensão e incerteza. Ainda assim, o proprietário reconhece que “tivemos a sorte de poder trabalhar”.
Também a loja do Grupotico, no centro das Maia, manteve o funcionamento. Cidália Alves, responsável de loja, explica que “por serem um serviço de saúde” tiveram “pelo menos de manter os serviços mínimos”. Estes serviços foram mantidos pela própria Cidália Alves visto que todos os seus colegas foram para casa aquando do fecho das escolas.
A responsável explica que na segunda metade do mês de março atendeu “muito poucas pessoas, só casos urgentes”. Em abril o movimento foi aumentando e o mês de maio esteve “quase em níveis normais”.
Apesar de nunca terem fechado portas, o uso da máscara só foi implementado aquando da apresentação do Plano de Desconfinamento que dava indicações nesse sentido. A higienização do espaço e das mãos foi das primeiras medidas a serem aqui praticadas.
Sobre o possível receio dos clientes, Cidália Alves explica que “neste momento as pessoas vêm sem qualquer receio” e que “o facto de serem clientes que já conhecem o espaço ajuda a ter essa confiança no serviço”.
O que pensam os empresários?
Inácio Fialho de Almeida, presidente da Associação Empresarial da Maia (AEM), explicou que “as pessoas continuam com algum receio”, mas “há bastante atividade que já foi retomada”. “Já se nota pelo trânsito”, brincou o também Administrador da Espaço Municipal.
O presidente da AEM entende que as pequenas e médias empresas estão a ter muitas dificuldades. “As grandes já têm os seus planos de contingência definidos com todo o material de proteção e com todas as regras” enquanto que as pequenas e médias empresas se vêm obrigadas a investir nestes materiais de proteção quando “tiveram a atividade parada neste tempo”.
“Nós não prevemos que antes de setembro possa haver uma atividade próxima daquilo que era” – o presidente da AEM afirma que algumas empresas vão manter o teletrabalho por mais algum tempo e que, nesse sentido, tem notado “estão a reagir muitíssimo bem”.
Sobre o futuro, Inácio Fialho de Almeida pensa que “a recuperação em termos económicos será lenta”. Afirma que este ano “não vai chegar ao que estava” e que, “infelizmente”, algumas empresas tiveram de fechar portas e outras “não se vão aguentar e não vão existir em 2021”.