A surpresa nas eleições legislativas Gregas é que a vitória de um partido radical de esquerda não foi surpresa. Foi a confirmação de um resultado esperado, fruto do constante atraso e resistência na aplicação das reformas que o país necessita. Desde há vários anos têm crescido em número de apoiantes as extremidades do espectro ideológico. Já não é novidade que os radicais de esquerda têm vindo a capitalizar o voto de descontentamento, já foi quase tudo dito, escrito e diagnosticado e, em boa verdade, pouco mais foi feito para tentar evitar a descrença das políticas de austeridade. O problema é que as soluções encontradas para o reajuste helénico continuam inconsequentes, piorando a performance política dos Partidos Políticos moderados junto dos eleitores.
O resultado superou as espetativas e marginalizou os partidos que governam o país desde 1974, o Syriza ultrapassou os 35% dos votos, elegendo 149 cadeiras no parlamento, ficando apenas a duas do necessário para ter maioria absoluta.
De forma empírica repare-se que o caso Grego é paradigmático e usual em Estados onde o bem estar social é precário e onde a esperança começa a desvanecer e, neste particular, nem tão pouco é novidade na História da Política Contemporânea Europeia. Recordem-se os efeitos da recessão que atingiu a Alemanha nos anos que se seguiram à crise da Bolsa de Nova Iorque, em 1929. Os capitais estrangeiros deixaram de entrar na economia alemã e os mercados internacionais fecharam portas, as fragilidades económicas germânicas levaram a falências sucessivas e os níveis de desemprego explodiram. O resultado foi naturalmente a instabilidade política e o crescimento dos extremos radicais, primeiro à esquerda e depois à direita. Esta instabilidade abriu a porta a regimes de governação excecionais, por força da emergência nacional, e a sucessivas eleições antecipadas culminando na ascensão do Partido Nazi ao poder e consequentemente numa ditadura de cariz nacionalista, com os efeitos que se conhecem.
Pese embora a não novidade das movimentações de votos nas urnas nestes fenómenos, importa lembrar este contexto para projetar o perigo de alastramento deste resultado a outros Estados Membros, sendo que o caso grego é, ainda assim, particular.
Não é por acaso que os Helénicos elegeram um partido que é antiglobalização, contra a Economia de Mercado e a favor da Economia Planificada pelo Estado. Todos os países da União Europeia têm uma extrema esquerda que por vezes apresenta uma subida percentual nos votos que capta, como é o caso do Partido Comunista Português. Estas ondas são tidas como normais, se não forem de dimensões exageradas como no caso do resultado do Syriza, nestas últimas eleições gregas. Este pico abrupto da extrema esquerda no resultado eleitoral Grego, deve-se à crise fiscal, que é consideravelmente mais grave do que nos outros países em assistência financeira, e os resultados das políticas de ajustamento são bastante mais nocivos, com taxas de desemprego acima dos 25%, particularmente nos jovens, onde se aproximam dos 60%. É o produto da resistência aos cumprimentos das metas estabelecidas, insistindo na aplicação dos pacotes negociados só a muito custo e adiados o mais possível, tendo já provocado um segundo resgate financeiro. Com uma dívida pública a ultrapassar os 175% do PIB e considerando os atrasos e negociações constantes sobre as necessárias reformas do país, pode mesmo dar-se o caso de vir a precisar de um terceiro resgate.
O mesmo acontece com a sua história política, com a ocupação alemã, a guerra civil, o regime militar até há pouco tempo e os elevadíssimos níveis de corrupção dos governos moderados de direita e esquerda. Basta recordar que a Grécia tem os mais elevados índices de corrupção e evasão fiscal da União Europeia e é, para muitos, o seu maior problema.
Na ronda de negociações que Alexis Tsipras prepara com a UE e na preparação do governo, vai resultar uma de duas hipóteses. 1 – O governo Grego entra em contradição com a sua campanha eleitoral e modera o seu programa de governo, tornando o país governável e em conformidade com os restantes países, respeitando os Tratados assinados voluntariamente, e para isto podem ser aproveitados como argumentos os recentes resultados ao nível de crescimento: com o país a conseguir inverter a queda da economia, sendo este o terceiro trimestre com evolução positiva e mais recentemente as previsões a indicar que o PIB deve crescer 0,6% este ano e projeta-se 2,9% no próximo; e contando que o défice desceu e deverá atingir 1,6% este ano, demonstrativo da diferença com os 15,2% que o país chegou a atingir em 2009, conseguindo estar mais baixo do que o português. 2- Ou entra em sentido contrário, acreditando que existirá perdão de dívida, e corre o risco sério de caminhar para um abismo que é o colapso financeiro. A dívida Grega é impagável fora da Zona Euro e o país colocar-se-á à mercê dos populistas que germinam nestes fenómenos.
Lembremo-nos que a eleição do Syriza, com vitória esmagadora, ocorreu na Grécia ontem, mas o risco de replicação noutros Estados da União Europeia é real. Para este efeito avaliemos que Alexis Tsipras tinha vencido as últimas eleições Europeias na Grécia com 26,54%, acabando agora por vencer as legislativas. Veja-se, em análise sintética, o que dizem os resultados das Eleições Europeias de 2014 e algumas sondagens noutros países:
- Na França cresce a Frente Nacional, Partido de extrema Direita, que nas últimas eleições Europeias garantiu 25,4% dos votos, vencendo-as.
- Em Itália, onde os radicais de direita têm perigosas raízes de atuação, cresce a Liga Norte, uma força separatista, que fomenta o nacionalismo apelando ao combate aos emigrantes, e tem na sua maior bandeira a criação da Padânia como Estado independente no norte da Itália.
- Na Holanda a terceira maior força política é já um partido de direita nacionalista, islamofóbico. O Partido para a Liberdade atingiu os 13% e defende a saída da Zona Euro e da União Europeia. Segundo algumas sondagens encontra-se à frente nas intenções de voto.
- Na Áustria as perigosas forças da extrema direita encontram-se a crescer no Partido Libertário da Áustria, nacionalista, que nas últimas Europeias conquistou 20,5% dos votos, o dobro do resultado em 2009, sendo a terceira maior força política.
- Na Finlândia continua a crescer o Partido dos Verdadeiros Finlandeses, novamente de extrema direita, eurocético, cresceu para 12,9%. O primeiro ministro Finlandês é dos mais acérrimos defensores do não perdão da dívida Grega.
- Na Hungria a terceira maior força política está capitalizada pelo Jobbik – Movimento por uma Hungria Melhor, uma força nacionalista, xenófoba e bastante associada ao antissemitismo, ficou em segundo lugar com 14,7% dos votos.
- Na Suécia o terceiro maior partido tem origem no nacionalismo xenófobo, que encontra modelo na Frente Nacional Francesa. O Partido dos Democratas Suecos em 2015 conseguiu 12,68% dos votos, elegendo 49 deputados.
- Na Dinamarca o Partido do povo Dinamarquês, eurocético, ultranacionalista e xenófobo, venceu as últimas eleições Europeias com 23,1%, e lidera as sondagens à frente dos liberais e social democratas.
- Na Polónia o pequeno partido Congresso da Nova Direita cresceu para 7,2%, e elegeu 4 Eurodeputados, afirmando que pretende “desmantelar a Europa por dentro”.
- No Reino Unido venceu um partido antieuropeu que defende a saída da Zona Euro, o Partido da Independência do Reino Unido, relegando os Conservadores do Primeiro Ministro Britânico para terceira força política.
- No complicado panorama político Belga, os separatistas que defendem a independência da Flandres da Nova Aliança Flamenga venceram, atingindo a marca dos 30%.
- Em Espanha, o Movimento Podemos, que nasce de uma junção de vários pequenos partidos de extrema esquerda eurocética, lidera nas intenções de voto com percentagens à volta dos 30%.
Considerando que o Syriza deverá coligar-se com o partido Gregos Independentes, fortemente eurocético, as eleições Gregas podem não ter sido as mais perigosas. Se a UE não souber reagir em uníssono e reparar os danos causados nos últimos anos, evitando a chegada ao poder de projetos populistas e sem o pragmatismo económico típicos das Democracias Socialistas e Social Democracias, a desunião pode ser iniciada nos próximos anos. A União Europeia precisa de ser mesmo União.
26 de janeiro de 2015. Aldo Maia